Estudantes da EJA, no Recife, escrevem diários inspirados no livro Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus

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A partir do projeto, alunos puderam refletir sobre suas trajetórias de vida

e aprimorar escrita, leitura e oralidade

Transformação a partir do acesso à literatura. Estudantes da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da escola Matias de Albuquerque, em Casa Amarela, Zona Norte do Recife, escreveram diários sobre suas trajetórias de vida e escolar inspirados na obra Quarto de Despejo, da escritora Carolina Maria de Jesus. Assim como a autora, que, apesar da pouca instrução, ganhou destaque na literatura brasileira ao expor sua dura realidade na favela, eles compartilharam suas histórias de vulnerabilidade, mas também de superação e esperança.

Durante a atividade, nomeada pelos estudantes de “Despejando Pensamentos com Carolina de Jesus”, alunos do quinto e do sexto módulo da EJA puderam refletir sobre a sua própria trajetória, aprimorar a escrita, a leitura e a oralidade, entre outros aspectos, progredindo exponencialmente no processo de aprendizagem. Toda a análise linguística e ortográfica partia sempre de trechos dos relatos dos próprios estudantes, compartilhados com os colegas em sala de aula.

O projeto foi idealizado pela professora de Língua Portuguesa Márcia Cavalcante. “A ideia veio a partir de uma escrita de si, de uma perspectiva de escrevivência, como diria Conceição Evaristo. Iniciamos com a leitura dos seus contos e depois partimos para a leitura de Carolina de Jesus. Começamos com o Diário de Bitita, em que a autora conta a sua infância, e depois partimos para o Quarto de Despejo, livro também em formato de diário que desencadeou o processo de escrita dos estudantes”, explica a docente.

Para além de escrever um diário relatando o dia a dia, a ideia foi a de incentivar uma reflexão sobre esse cotidiano. Dessa forma, o projeto proporcionou aos estudantes um mergulho em si mesmos. “Muitos alunos se identificaram com a história de Carolina, até por uma questão identitária também, de se perceber numa realidade difícil como a dela, de todos os caminhos que ela percorreu para chegar aonde chegou. Eles adentraram em toda a miséria descrita e refletiram sobre os momentos muito difíceis que eles também vivenciaram ao longo da sua trajetória de vida e escolar”, conta Márcia.

A trajetória de Samaria Lopes, aluna integrante do projeto, ilustra bem essa identificação. “Carolina me inspirou a crescer, a fazer algo melhor. Se ela venceu, passando por mais dificuldade do que eu passei, eu também posso vencer. Ela foi mãe solo igual a mim, criou os filhos sozinha. A felicidade dos filhos dela em ver a mãe trazer um pouco de comida pra dentro de casa, eu também passei por isso”, relata a estudante.

O projeto representou a primeira vez que muitos dos estudantes leram um livro. O direito à literatura foi, inclusive, um dos pilares da iniciativa. “No início, a leitura de Carolina trouxe alguns desafios, como os termos que eles não conheciam, mas foi uma leitura que instigou o aprendizado a cada instante. Acho que um dos ganhos do projeto é eles estarem se vinculando ao conhecimento, com muito desejo de aprendizado. Isso ficou muito claro pela participação ativa nas aulas”, avalia a professora.

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